Outro dia eu ouvia seguinte oração: “Senhor, me ajude a perseverar, porque sem você eu não consigo”, até então nada de diferente, até os incrédulos clamam a Deus quando precisam, mas essa prece em particular mexeu muito comigo, e me fez não orar nessa hora, e sim parar para ouvir a continuidade desse clamor.
Essa oração foi feita por um detento num ambiente recluso, condenatório, o verdadeiro lugar “onde os fracos não tem vez”, e ao ouvir isso eu pensei que essa mesma oração se feita por mim, não teria o peso, tampouco o significado dessa feita por esse homem privado de do mais áureo e pueril direito de ir e vir.
Se eu tivesse feito essa oração, Deus bem que poderia me dizer: “Perai, ow gurizão, olha bem pro seu lado, veja o tanto de opções que te dou, não quer cair nessa tentação, pois bem, dê meia volta e vá embora”, ou então: “Ei, meu filho, já não te falei para não ser amigo desses que me desprezam, não os atenda, tampouco alimente a relação, bata o pó da casa deles e volte para os seus”, ou ainda: “Ei, filho, já não te falei que não quero você ai, vá para casa”.
Mas, o homem recluso não pode ouvir isso de Deus. Ele está o tempo todo sujeito às mesmas intempéries que um presídio oferece diariamente por anos a fio, até que se cumpra a pena pelo que foi cometido (ou não). Ele não pode voltar para casa, ele não pode entrar no seu quarto fechar porta e orar em secreto, ele não pode se dar ao luxo de não viver naquele inferno sem prestar atenção, e, por vezes, participar diretamente da condenação de outros.
Esse miserável homem está fadado a ser só mais um no lugar onde reina a maldade, o crime, a mentira, a desesperança, o vicio, a condenação e a morte. Ou seja, ele vive no reino das trevas e precisa ser a luz lá dentro sem que contar com uma família, uma igreja, ou a primária e doce liberdade. Deste modo, a prece que ele fez a Deus ganha muito mais valor e necessidade.
Por isso, minha oração aquele dia foi: “Deus, ouve a oração desse meu irmão que eu não conheço, desse homem que talvez eu nunca mais veja, dessa alma que pecou, mas que agora recorre a ti. Hoje tudo o que peço é por ele”.
Ele não tinha, e não tem, nada para oferecer a Deus, apenas suas contidas lágrimas. No final daqueles poucos minutos de integração espiritual e social com a igreja de Jesus, ele voltaria ao convívio difícil de um barril de pólvora humano. Exercer a santidade ali não tem nada a ver com usos e costumes, tampouco está ligado à fé que você professa, pela frente ele tem diariamente a árdua tarefa de exercer sua liberdade em amor, estreitando laços de amor com Deus e com o próximo, pois isso é ser santo.
E é desta forma que Deus responderá a oração, lhe dando força de não sentir-se penalizado ou injustiçado pela situação atual, pois pobre do individuo que cede à sua alma o direito de ter pena de si próprio, esse detento, assim como eu, precisa redescobrir o poder sobrenatural da Palavra de Deus, o poder da palavra que transforma, e não apenas na teoria, mas transforma a existência em querer estar com o Deus da Palavra, o Deus criador de tudo, o Deus no qual existo, o Deus que estava em Cristo reconciliando consigo o mundo.
Ali, chorando junto com aquele homem, eu finalmente entendi que as dimensões que tocam a gente não estão disponíveis aos sentidos de terceiros, enquanto o Espírito enviado por Cristo trabalhava nas nossas vidas, eu e aquele homem preso formávamos a igreja de Jesus, a mim é concedido o direito de ser livre no mais excelente prisma, o espiritual, e naquele momento, enquanto clamávamos a mesma coisa ao Pai das Luzes que não muda, éramos livres em Cristo Jesus que nos libertou para uma vida de glória ao lado de Deus Pai.
Ao Cordeiro Digno de honra seja minha adoração...
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