Eu tive dó de mim...

Ainda na “pegada” do último post, essa idéia, aqui transformada em texto, nasceu na mesma igreja evangélica, depois de ouvir uma mensagem coerciva no medo e na imposição.
A compaixão [sarcasmo] que tive foi de mim mesmo, pois se o que ouvi é verdade: eu estou F*...literalmente.
A fala ouvida para o nascedouro dessa dó foi: “Posso escapar do fogo do inferno, mas não escapo do fogo consumidor de Deus no dia final”, e também: “Milhões vão para o inferno todos os dias, e você pode se surpreender com o seu destino”. MEU DEUS. Tenha dó de mim. ARREGO.
É incrível como o ser humano tem facilidade em mandar o outro (seu próximo) para o inferno. Qualquer coisinha é já o mandamos para inferno. Morreu budista: vai para o inferno. Adulterou: vai para o inferno. Ficou bêbado: vai para o inferno. Matou: vai para o inferno. Saiu da igreja: vai para o inferno. Não quis o Deus da religião: vai para o inferno. Não deu o dízimo: vai para o inferno. Engravidou: vai para o inferno. Foi preso: vai para o inferno. E por ai vai...
São tantas as razões pelas quais mandamos ‘infernar’(falo como igreja), que acabamos por viver na atmosfera de medo constante. Cuidado com o que você faz com sua vida. Você pode ir para o inferno. O pregador chega ao cúmulo de mandar a própria mãe para o inferno, afinal cada um presta conta de si.
E o pior é que parece bíblico tudo isso. Parece coerente mandar para o inferno, já que o individuo nasceu, viveu e morreu sem conhecer a Cristo. Nunca adorou a Deus. Nunca “pagou” o dízimo, logo seu destino provável é o lago de fogo preparado para o diabo e seus anjos. Eu digo parece, porque apenas parece bíblico. Mas não é. Selar o destino de alguém nunca foi, nem nunca será papel do homem. Eu mal posso comigo mesmo. Você mal pode consigo.
Pregadores ao longo dos anos tem perdido um tempo precioso em que poderiam estar pregando o Cristo, obedecendo sua ordem de testemunhar, mas se detém inapelavelmente pregando inferno, diabo, pecado e morte. Uma força coerciva bastante eficaz.
É obvio que coação pelo medo pode até gerar disciplina, pode fazer com que o outro faça o que eu quero, mas nunca será capaz de gerar OBEDIÊNCIA, tampouco a FÉ.
Existe uma multidão de crentes que levantam seus braços aceitando não o Jesus que professam forçosamente, mas aceitando quaisquer perspectivas de salvação do INFERNO. Se o Jesus fosse cearense e se chamasse Genésio Nonato ele aceitaria, pois o que importa não é QUEM eu aceito, mas PORQUÊ: para não ir para o INFERNO. Quando na verdade, eu deveria aceitar o CRISTO porque ele me amou primeiro, e estar com ele é a melhor coisa que pode me acontecer, tanto agora quanto depois. Vivo ou morto. Não há, em hipótese alguma, outro lugar onde eu anseie estar mais do que ao lado do MEU SALVADOR.
Mas, se perde tanto tempo coagindo no medo. Trabalhando a ignorância. Impondo a verdade que engendra poder a mim, homem, ao invés de oferecer o evangelho que dá a Jesus o crescimento que ele merece, e não eu (Jo 3:30).
Mas, também se creio nessa linha de pensamento, eu tenho mesmo em que pensar em fuga do pior. Já que escapando da surra de fio desencapado eu caio na surra com galho de goiabeira. Não me batem na cara, mas destroem a sola do meu pé. “Posso escapar do fogo do inferno, mas não escapo do fogo consumidor de Deus no dia final”. Segundo esses, fundamentalistas, isso não tem a ver com salvação, mas com galardão. O fogo de Deus que provará minhas obras. Eu preciso ser o melhor possível. Orar o maior número de tempo que agüentar. Dar com alegria. Ser um membro ilibado. Porque,se não,...ah se não... ai de mim. Estou nas mãos de um “deus irado”. Um pobre pecador, salvo, mas nas mãos de um deus irado.
Ora, que crença mais sádica e sadomaso. É fogo pra todo lado. A eternidade ideal para um incendiário. O Deus perfeito para um sóciopata.
Porém, a bíblia apresenta um Deus de amor. Um Cristo, que era o verbo que estava com Deus e pelo qual tudo se fez. O Jesus que me amou de tal maneira a dar sua própria vida, como prova, e exemplo, de um amor sobremodo excelente, e que me espera na eternidade com algo tão bom, mas tão bom, que eu nunca sequer sonhei com tanta maravilha (1 Co 2:9). É deste amor e desta esperança que tenho de testemunhar.
Pro inferno com o inferno. EU NÃO POSSO MANDAR NINGUÉM PRO INFERNO.
Apresentar o inferno como chamamento para a graça é desconhecer o amor. É como ter mas não crer, é como crer e não saber que se tem. Tempo perdido com a pregação que não permanece para sempre.
Eu tive dó de mim, porque se o que ouvi for verdade eu não quero fogo, seja lá de qual lado ele vier.
Eu tive dó de mim, porque se o que ouvi for verdade eu estou completamente errado na minha crença, desperdiçando a mais valiosa força na fé num Deus cruel e com o qual não quero passar a eternidade.
Eu tive dó de mim, porque se o que ouvi for verdade eu não conheci ninguém ainda é capaz de se fazer merecedor da libertação eterna. Todos que amo e amei estão condenados a um sofrimento horrendo, pelo qual eu seria capaz de me entregar para livrar tanta gente. De modo que meu sacrifício acaba por se tornar tão, ou mais poderosos que a própria cruz na vida de Jesus.
Eu tive dó de mim, porque se eu estiver certo há muita gente ouvindo inverdades e obedecendo por medo, vivendo na esquizofrenia evangélica, na qual se é um dentro dos muros do reino, mas vive-se o outro, o verdadeiro eu humano, fora dos portões dos sacros templos. O que acarreta uma leva de doentes mentais clínicos.
Eu tive dó de mim porque vou para o mesmo lugar de muita gente que nunca entrou numa igreja evangélica, e pena que muitos crentes que hoje eu amo não querem ir para um lugar com esse tipo de gente...para muitos deles eu “to indo pro inferno...”

Deus, a quem devo honra, tenha dó...

*: frito

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