Um Breve Ensaio Sobre Minha Saída

Essa noite eu decidi entregar meu ministério para o Senhor, mas entregar de verdade, abrir mão dele. Eu sei que minha vida toda é de Deus (e isso inclui meu ministério), sei que hoje só carrego o “Pr” antes do meu nome porque Ele quis, e tudo o que faço, o faço na força do Espírito, tenho um ministério que serve para servir a Deus. Só isso. Mas eu o entreguei.
Abri mão, não quero mais, não tenho mais forças para seguir. Acho que Deus pegou pesado demais comigo, eu perdi! Não tenho mais condições de seguir pregando, dói saber que ainda tenho compromissos ministeriais a cumprir, sem querer fazer eu preciso fazer. Não quero mais pregar, tanto fel nos meus lábios e em minha fala é fruto de uma fonte de amargura que tomou conta do meu ser.
Das minhas ultimas pregações têm saído fel e dor. Minha alma está ferida. Não agüentei a pressão. Sei que meu ministério é de confrontação, meu serviço à frente de Missões Estaduais cumpriu o papel de acusador e pedinte. Mostrando uma triste realidade da nossa convenção estadual. Mas descobri os motivos da barrocada, da decadência, da depressão financeira, e é sempre ele quem está por trás, a saber, o orgulho humano.
Não quero mais travar lutas para apenas expor o que penso, há seis anos eu faço isso, e só tenho 24 anos; estou desfalecendo, me tornando cético, crítico e antipático. Não quero isso, quero manter a inocência da fé que um dia me apresentou o Salvador. Não quero mais servir a homens orgulhosos, eu nunca quis tomar o lugar de ninguém, não faço jus à fama de “ameaça” que carrego. Não sou eu quem prega bem, são eles que não preparam sermão. Sou apenas mais um novel.
Estou com dor, meu coração está chorando, meu corpo nem lágrimas tem mais, faço força pra chorar, como uma criança birrenta, mas as lágrimas não saem, apenas essa cara bicuda de choro, mas dói. Uma carranca fechada me acompanha, um cinismo não saí da minha face; eu não acredito em mais ninguém, mas não consigo deixar de ajudar, meu coração não descansa, e minha mente não para de pensar que eles estão errados.
Não é justo continuar pagando salário para um genro ou um amigo, chamando-o de “missionário”, que nada fazem de concreto, enquanto os que realmente necessitam de apoio padecem no campo sem um sustento digno. Não consigo continuar compactuando com isso. É muita podridão, é uma gente muito orgulhosa, que trata o dizimo como um simples recurso, e trata um missionário como um funcionário. Pelo amor de Deus eles são obreiros de Deus, não são e nunca serão nossos funcionários. São homens e mulheres que disseram: “Sim, eis-me aqui!”.
O fato de apenas administramos o dinheiro de seu sustento não nos dá o direito de decidir quem é ou não missionário, não nos dá direito de tratá-los como funcionários, nem muito menos nos dá o direito de tratar o dizimo dos dízimos como uma simples fonte de recurso. É dinheiro consagrado, de origem honesta, oferta de um povo pobre que trabalha arduamente todos os dias, para que nós “pastores” possamos pensar apenas em cuidá-los. Não podemos desrespeitar essas ofertas. Não podemos trair a confiança dos santos.
Nossa historia de falta de ética, de suborno, de nepotismo eclesiástico, de improbidade administrativa, de farra com dinheiro santo, de prostituição da liderança, de um nojento orgulho colonial precisam ter fim. As provas históricas do nosso erro estão às vistas de todos. Nossas perdas podem ser sentidas por qualquer membro de uma de nossas igrejas. A antipatia e distanciamento dos cabeças da denominação já passaram da hora de acabar.
Meu bom caráter e minha inocência me levam a crer que somos pobres como denominação, não por má fé ou por ladroagem, mas por incompetência administrativa e, principalmente, pelo pecado tão inerente aos lideres da denominação no Estado (quiçá na nação). Os homens que estiveram nas últimas quatro décadas na direção dessa convenção são conhecidos de todos, e cabem na mão esquerda do Lula (segundo Diogo Mainardi –e endossado por mim –: “um pelego oportunista”), continuam pobres e com famílias a beira do abismo.
Não sei o que Deus queria quando me colocou na centro da podridão batista do MS. Nem imagino o que Ele quis quando meu pos ao lado dos dois principais nomes da denominação nos últimos 20 anos, apenas para ver seus erros, equívocos e precipitações. Caras que eu respeitava, mas que erraram descaradamente na minha frente. Falharam comigo, mostraram fraqueza de caráter. Eu fiquei desapontado (estou sendo eufemista).
A solidão a qual fui submetido depois da minha ordenação me enfraqueceu. Eu pensava que apenas meus quase quatro anos de seminário seriam um tempo de deserto e provação. Os anos que esperei e não recebi cuidado pastoral, os anos em que não tinha dinheiro nem para xérox, os anos da minha úlcera e da minha taquicardia, anos do afastamento do meu pai, enfim, os anos que viveria de novo com a mesma intensidade se tivesse oportunidade, mas que deixaram marcas na minha personalidade.
Meu primeiro ministério foi um baque dolorido. Chorei e fiquei tão desesperado a ponto de procurar (e não encontrar) migalhas na casa do meu pai. Fui expulso por pregar sobre o perdão, mas eu juro que não era minha culpa. Eu queria pregar sobre mordomia, pequenos grupos, missões, mas o que fazer quando todos meus sermãos terminavam falando de perdão. Um sermão é a mensagem de Deus dada à igreja, o pastor apenas um instrumento. Um toca-fitas toca apenas a fita que nele é colocada. Em mim era colocada essa mensagem: perdão. Eu não poderia fugir disso. Estaria fugindo do meu chamado.
Reino dividido não prospera, eu entendi isso, até tentei satisfazer a igreja, até tentei agradar os donos dela. Mas, eles poderiam ser os gerentes daquele negócio, todavia eu tinha ordens diretas do dono, e é Ele quem paga, soprando em minhas narinas todos os dias o sopro de vida para eu vir a lume neste mundo, dando seu aval para o peregrino continuar sua jornada. Como não obedecê-lo?
Tudo bem, doeu, mas passou. Depois sofri por um mês na Andorinha, trabalhando num lugar que me afastava da igreja, que usava todo meu tempo. E sofria por que sabia que Deus sentia minha dor, mas eu não via sua mão a me sustentar. Eu não via seu poder agindo para me tirar dali. Mas foi rápido, durou 30 dias exatos. E até parece que há um significado numerólogo neste período.
E então veio a convenção. Mesmo contrariando alguns eu larguei tudo para ir trabalhar na “administração dos batistas do MS”. Senti-me do mesmo modo de quando entrei no seminário teológico, gente comentando que eu tinha errado o caminho, que lá não era meu lugar. Na primeira ocasião era o brinco, a bandana, as sandálias com calça larga e a mochila colorida, que levava minha “família batista” a pensar que STBOB não era meu lugar. Agora é minha idade precoce, bem como os muitos interessados em minha vaga, que engendram os comentários de que eu não devia estar na C.B.S.M.
Bem, se havia uma guerra, eu perdi; se haviam adversários, eles venceram; se buscavam meu lugar, ele está desocupado; e se havia uma obra a ser feita, ela continuará sendo feita, pois o Reino de Deus é maior que o homem. Eu simplesmente não agüento mais. Se sentem ameaçados quando eu prego, não prego mais; se não tem espaço para mim, eu nem procuro mais; se eu não era bem vindo nas reuniões de pastores, não vou mais.
Eu perdi, de novo. Um dia eu vou ganhar, nem que seja só a vida eterna, mas vou ganhá-la. Eu me apego à esperança que Paulo recomendou aos romanos, a esperança da adoção final, de glorificação do nosso corpo. Nem que me sobre apenas a esperança, que eu perca família, bens, ministério, mas a esperança da salvação e a graça remidora essas eu não posso perder, pois me foram dadas pelo mesmo que rasgou o véu do templo, pelo mesmo que trouxe os mortos de volta a Jerusalém. Oh, a esperança da salvação me sustenta a não blasfemar.
Eu não agüento mais ver o Reino ser tratado como simples politicagem, ver a igreja ser o palco e o objeto de barganha dos orgulhosos. E se a vontade de Deus para mim não envolve igreja, mas apenas a burocracia suja e jactanciosa da vida convencional, então eu abro mão. Deus em tuas mãos eu entrego meu ministério. Quem sabe um dia eu volto. Talvez quando casar.
Não me arrependo de ter aberto mão dos prazeres da juventude. Não me arrependo de ter me privado de namorada, de dinheiro, de oportunidades financeiras. Eu fiz consciente, convicto de que aquela era vontade de Deus, e mesmo que em vida eu não receba as recompensas das minhas escolhas, estou certo de que a fonte da minha esperança irá me concedê-las no dia final.
Eu procurei fazer o certo, pregar o que Deus colocava no meu coração, e existem muitas testemunhas do que digo. A despeito de haver ainda muitos podres hipócritas na liderança da igreja de Cristo, o controle central está nas mãos de nosso Senhor e Salvador, tenho certeza que Ele ainda colocará tantos outros servos íntegros e pios na direção do seu povo. Gente muito mais forte do que eu, tantas outras promessas surgirão.
Como promessa eu fui apenas mais um candidato a estrela, tipo um dos muitos candidatos a ‘pelés’, garotos que anseiam ser ídolos, promessas que aparecem nos grandes clubes todos os dias. Imaginem quantos ‘robinhos’ não foram descartados no Santos para que um saísse como realidade para ser rei na Espanha; ou quanto substitutos do Zetti não treinaram até que aparecesse um que se firmasse no São Paulo como o maior ídolo da história do clube. Eu fui apenas mais uma promessa malograda de craque. Outro surgirá e se firmará.
Conquanto, para que uma ponte chegue ao destino, muitos pilares precisam ficar pelo caminho. Hoje me sinto como uma grande coluna de uma ponte, vejo seu fim lá longe, mas apenas o vejo, não estou lá; entretanto os trabalhadores (obreiros da igreja) estão conseguindo me firmar lá no fundo do rio. Eu fico, mas firmo as estacas para que um outro alcance êxito.
Estive ponderando sobre os últimos anos da minha vida. Desde a desfacelamento da minha casa. Em 2004 foi o ano do vislumbre do seminário, e vermos que era possível e melhor viver sem meu pai em casa. 2005 o anos do stress; ficou gravado pela frase do Dr. Haydn: “Você tem 22 anos, se quiser chegar aos 30 precisa mudar seus hábitos”. 2006 o ano da sincera confiança em Deus, e da reviravolta, um seminarista rebelde e bocudo é conciliado e ordenado em duas semanas. Só Deus mesmo.
Este ano (2007) foi difícil, mais do que pude suportar. O processo movido pelo meu pai contra minha família teve sua grande contribuição, mas a sujeira e hipocrisia que descobri na denominação me abalaram as estruturas. E como quis Deus não me abrir nenhuma porta de trabalho na igreja, não me resta mais nada a fazer do que apenas dizer: “Até logo ministério”.
{Aqui cabe um parênteses: 2008 tem sido o ano da comprovação da incoerência do “evangelho X igreja evangélica”. Dois turbilhões me assombraram. 1º o fato de descobrir uma enorme disparidade entre o evangelho bíblico, vivido por Jesus, e aquele que hoje é pregado pela igreja; e 2º o fato de que fui criado para ser um “sacerdotizinho”, treinado para ser pastor, e capacitado para pregar “doutrina e dogma”, e não as boas novas de Jesus. Como fazer para pregar e viver tão somente ‘O EVANGELHO DA GRAÇA DE CRISTO’? – meus artigos postados no meu blog evidenciam a dor e interregoção de uma crise}.
E também não sei se quero continuar a trabalhar em uma igreja dividida e preconceituosa, que acentua diferenças ao invés de saná-las. E também não pretendo relatar o que penso da igreja, meu blog faz isso por mim. Mas quero terminar este ensaio com a mesma dor sentida por um profeta, quando proferia as palavras do Senhor dos Exércitos e não se sentia ouvido.
Jeremias 17:14-18 finalizará por mim:

“Cura-me, SENHOR, e sararei; salva-me, e serei salvo; porque tu és o meu louvor. Eis que eles me dizem: Onde está a palavra do SENHOR? Venha agora. Porém eu não me apressei em ser o pastor seguindo-te; nem tampouco desejei o dia da aflição, tu o sabes; o que saiu dos meus lábios está diante de tua face. Não me sejas por espanto; meu refúgio és tu no dia do mal. Envergonhem-se os que me perseguem, e não me envergonhe eu; assombrem-se eles, e não me assombre eu; traze sobre eles o dia do mal, e destrói-os com dobrada destruição.”


Soli Deo Gloria

No Cristo, em quem tenho paz e salvação,


Pr.(?) Ludyney C. Moura
http://www.crentepensando.blogspot.com/

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